Ontem, hoje e amanhã, domingo de páscoa, estaremos postando uma adaptação do devocional produzido como projeto de conclusão do Mestrado em Formação Cristã e Discipulado do nosso Centro, que abre uma nova turma em fevereiro de 2020. Se você tem interesse em saber mais sobre o próximo curso, pode ler aqui e entrar em contato para mostrar seu interesse.
Eu era a multidão…
Se a Boa Sexta-feira foi o crescendo da jornada da Igreja pelo deserto na quaresma, o Sábado Santo1 é o último suspiro de silêncio, na linguagem musical, uma fermata.
A mesma multidão que se ajuntou ao redor de Jesus nas pregações, gritou Hosana na segunda-feira. Essa mesma multidão, inebriada pela oportunidade de comandar o braço romano através de seus gritos de “crucifiquem-no!”, cai em silêncio hoje
O Sábado silencioso1 nos lembra do propósito da solitude e do silêncio como uma prática cristã, a fim de desvelar os diálogos internos plásticos das nossas vidas e voltar para um terreno de realidade na presença de Deus..
No silêncio, voltamos ao que se passou. No silêncio, somos forçados a reconhecer nossos fracassos e nossas incapacidade de retornar. Percebemos que éramos nós que ingenuamente proclamávamos Hosana, e que fomos nós que, quando percebemos que Jesus não estava aqui para nos entregar um Reino imediatista, gritamos Crucifiquem-no. Somos Pilatos, confrontados pelas questões que não podemos responder, querendo provas que nunca teremos, tomando decisões que não são ideais, mas que são do jeito que são. O que é a verdade, afinal de contas?
Como aqueles com vidas internas apressadas, queremos encher o silêncio do Sábado Santo, assim como quando alguém morre repentinamente e as pessoas se unem em sua perplexidade. Recentemente, o meu avó faleceu subitamente. Em momentos assim, somos impulsivamente levados a tentar encontrar significado e sentido na morte. Mas mesmo as tentativas mais brandas de encontrar sentido na tragédia da morte, parecem irreverentes, inúteis e erradas. Todos os nossos esquemas elaborados de narrar nossas vidas são desvelados quando vivenciamos a morte e então somos, com razão, deixados em um silêncio vazio.
Em nossa pressa para afirmar que Deus fala hoje, podemos acabar por, inadvertidamente, insistir que Ele é um tipo de tagarela que na verdade nunca para de falar. Isso com certeza é resultado do que Voltaire descreveu quando disse: “Se Deus fez o homem à sua imagem e semelhança, o homem retribuiu muito bem a gentileza.” Mas o Sábado Santo insiste que Deus está em silêncio. Em silêncio em relação às nossas exigências de significado. Cristo realmente morreu, e para todos naquele primeiro sábado santo, tudo estava perdido.
Habitar esse sábado silencioso é na verdade estar em um espaço da história de Deus que pode nos ajudar a entrar na nossa própria realidade. O “agora e Ainda Não” que os Cristãos são treinados a viver, também é encontrado no sábado Silencioso. O Sábado é o tempo entre a morte e a ressurreição. Ainda que Cristo – como vamos celebrar amanhã – tenha iniciado a nova criação em sua ressurreição, nós continuamos a esperar em uma fé paciente pela ressurreição de todas as coisas (Romanos 8: 22-25).
Então, nesse Santo e silencioso Sábado, nos juntamos ao salmista no Salmo 13:
“Até quando, Senhor? Para sempre te esquecerás de mim? Até quando esconderás de mim o teu rosto?
Até quando terei inquietações e tristeza no coração dia após dia? Até quando o meu inimigo triunfará sobre mim?
Olha para mim e responde, Senhor meu Deus. Ilumina os meus olhos, do contrário dormirei o sono da morte;
os meus inimigos dirão: “Eu o venci”, e os meus adversários festejarão o meu fracasso.”
O Sábado Santo é um período que nos treina na disciplina central do cristianismo, que é a espera. Nossas esperanças de fazer alguma coisa “acontecer” são desvendadas e somos deixados com a opção de confiar que o Deus silencioso está presente.
Ainda assim, mesmo na morte de Cristo, na inatividade e no silêncio, podemos ver um reestabelecimento do mandamento sabático e um eco do que Deus fez durante a criação: o descanso. Jesus observa um sábado derradeiro ao se deitar no túmulo. Esperamos e confiamos em silêncio enquanto o Rei dorme.
Como James Hanvey diz;
“O Sábado Santo é o tempo Dele.
É o tempo no qual aprendemos a confiar no sacrifício de amor, o qual a morte não pode subjugar nem compreender.
No Sábado Santo passamos a ver que é Ele que fez da morte o seu instrumento. Não para causar terror ou submissão, mas para nos trazer mais intimamente para o seu lado.
Na escuridão purificadora do santo sábado, descobrimos o Sábado da nossa espera.
Chegamos no final do nosso caminho e no início do Dele.
É apenas Cristo que pode nos levar ao domingo de Páscoa, e é assim em todos os sábados santos das nossas vidas.”
– Pause e reflita –
Você pode tirar algum tempo hoje para encontrar um pouco de silêncio e solitude?
Pelo que você espera na vida?
Gaste um tempo colocando essas coisas diante do Senhor, confiando Nele à medida que Ele fala, ou se conscientize da presença Dele, mesmo no silêncio.
- Para fins de compreensão da totalidade do texto, ao invés de denominar como “sábado de aleluia”, como comumente é titulada a data nos países de língua portuguesa, manteremos os termos utilizado pelo autor: “silencioso” e/ou “santo”. ↩