Nosso desejo em ajudar outros a conhecer mais a Deus é baseado em motivações saudáveis. Entretanto, nos últimos anos, percebi que existia uma lacuna entre alguns dos meus métodos de discipulados e seus resultados. Se meu objetivo é transformação cristã, por que vejo tantos afastando-se de nossos ministérios sem mudarem? Como a mensagem foi distorcida? Após anos de relacionamentos de discipulado e experiência em missões, eu descobri que os modelos primários a que fui exposto para acompanhar pessoas a uma maior maturidade no Reino de Deus, muitas vezes refletiam mais o que o líder/discipulador desejava, e não tanto do caráter de Deus ou o que o discípulo precisava. Aqui exploraremos uma estratégia de discipulado convidativo que facilita o diálogo e um ambiente de amor em ordem a proporcionar participação na vida de Deus e crescimento cristão em comunidade.
Subida e Queda
Não é fácil enxergar por uma máscara de ninja feita para crianças, mas isso não era um problema para mim com 8 anos. Sobre a gola alta preta e a máscara de ninja, eu estava coberto de camuflagem de exército me sentia fantástico. Esgueirei-me entre arbustos e sombras pela minha rua até chegar ao ponto de entrada perfeito – uma árvore enorme atrás da casa de um vizinho que estendia seus galhos até o quintal do alvo. Eu subi, escorreguei pelo galho mais longo e contemplei a cena abaixo. Carl, meu melhor amigo do time de futebol (alto, magro e óculos de aros grossos) era empurrado e insultado pelos valentões do bairro. Eles não eram fáceis… na semana anterior atearam fogo no cabelo de uma menina. Eu estava determinado a mostrar-lhes justiça.
Minhas mãos úmidas (eu estava nervoso) seguraram o taco de madeira que meu irmão comprara numa loja do exército há um ano atrás. Infelizmente, porque eu estava com luvas grossas de inverno, o taco escorregou das minhas mãos, quebrando os galhos logo abaixo. Desequilibrado e na tentativa de recuperar minha única arma, eu caí também, derrubando vários galhos numa pilha logo atrás dos encrenqueiros. Carl deu uma olhada na confusão e fugiu. Eu não o culpo por isso.
Levantei rapidamente enquanto os oito garotos viravam para avaliar-me. Essa era minha chance! O momento finalmente chegara. Os poderes da justiça estavam comigo, eu sabia que Deus em Seu poder traria vingança contra esses mal-educados e eu me tornaria mais do que uma lenda da vizinhança, eu seria um mito. Eu me tornaria um super-herói!
Não deu certo.
Em menos de dois minutos, eles conseguiram tirar minha mácara e começaram a me espancar violentamente. Eu tentei ser corajoso, mas um deles me segurou pelo pescoço com uma serra circular e exigiu que eu lhes trouxesse dinheiro. Eu concordei, sem intenção voltar tão cedo, e eles soltaram um menino de 8 anos machucado, zangado, mancando, para pegar sua máscara de ninja, sua dignidade e ir para casa.
Como a serra circular fez um corte no meu pescoço, minha mãe me levou para tomar vacina contra tétano no traseiro, deitado, sem cerimônias, no colo da esposa do meu pastor (ainda me surpreende o fato de ser ela quem me deu a injeção). Não preciso dizer que este não era o final heroico que eu esperava.
Heróis e Feridas
O tipo de super-heróis e rainhas guerreiras destemidas que cativam nossa imaginação, moldam nossa expectativa sobre quem gostaríamos de ser. Imaginava-me como um arauto da justiça, e dizia que a fama e a glória que viriam com esse papel seriam incidentais. Era uma ilusão. Lá no fundo desse heroísmo, havia um clamor desesperado por aceitação e uma reputação gloriosa. Muitas vezes essa também é a trajetória humana em busca da liderança – onde a esperança sincera se distorce através de nossas carências, e chegamos às posições ministeriais como adultos envolvidos num redemoinho de mágoa, expectativa, insegurança e medo. É óbvio que ninguém planeja ser um líder controlador ou manipulador ou arrogante, de forma alguma, mas na caminhada, nossos medos e mágoas colidem com a imagem de liderança que é mais influenciada pela cultura (e nossa trajetória de vida) do que por Jesus.
A boa nova é que aprendi que existe outra maneira. Não tem sido fácil, mas a trajetória em si mesma me desafia e me faz crescer mais à semelhança de Cristo, provendo assim uma forma de compartilhar Sua vida com aqueles a quem ministro. Essa maneira exige que eu faça mais perguntas e ofereça menos conselhos. Ela me molda para ser pastor e cuidador; e gera divergência e dor, mas finalmente convida cura e crescimento diretamente do Pastor e do Cuidador.
O discipulado foi exemplificado para mim, muitas vezes, por um líder que fez uma pergunta ou duas e já oferecia a resposta que eles pensavam que eu precisava ouvir (com uma ou duas exceções). Conselho, encorajamento, identificação com histórias de suas próprias vidas, admoestação, repreensão, etc, tudo o que era considerado necessário para me consertar.
E doía. Encaixar minha própria história na perspectiva de alguém foi dolorido e nada libertador. A desordem confusa era a ausência da Fonte que eu precisava; o Manancial de Vida que habitava em mim. Eu bebia garrafas de água dos líderes, e apenas a recusa obstinada em deixar o meu crescimento interno (e expectativas ministeriais) nos padrões deles me faziam seguir.
Nesse processo, eu aprendi que a maneira como eu abordo alguém sob minha liderança ou influência, reflete meu eu verdadeiro ou falso; como trato aqueles ao meu redor pode mostrar minha dependência de Jesus ou meus medos, inseguranças, suposições e tentativas de controle. Quando eu nutro uma experiência de fé que enfatiza participação na vida de Deus, isso enriquece o Corpo de Cristo porque o equilíbrio do poder parte do monólogo (em uma direção) para o diálogo (inclusão e comunidade). Quando crio espaços onde supõe-se e espera-se que todos os envolvidos são habitados pelo Espírito e que abordamos nossas conversas na presença de Cristo, promovemos compreensão e compaixão crescentes, assim como enfatizamos a beleza da natureza unificadora do Espírito Santo. Criar diálogos, me obriga a engajar na mútua submissão do coorporativo.
Em Filipenses 2:5, Paulo exorta a igreja em Filipos a imitar Cristo. Cristo tem autoridade e poder além do que podemos imaginar, mesmo assim Ele mostra Seu poder da seguinte maneira:
Jesus sabia que o Pai havia colocado todas as coisas debaixo do seu poder, e que viera de Deus e estava voltando para Deus; assim, levantou-se da mesa, tirou sua capa e colocou uma toalha em volta da cintura. Depois disso, derramou água numa bacia e começou a lavar os pés dos seus discípulos, enxugando-os com a toalha que estava em sua cintura. (João 13:3-5, NVI)
Essa foi sua penúltima palavra sobre liderança e poder – lavar os pés dos Seus discípulos! Sua última palavra sobre poder e autoridade foi auto sacrifício, quando ele se entregou na cruz.
Da mesma forma, Paulo exorta os Filipenses “Nada façam por ambição egoísta ou por vaidade, mas humildemente considerem os outros superiores a si mesmos. Cada um cuide, não somente dos seus interesses, mas também dos interesses dos outros” (Filipenses 2:3-4). Cristo abriu mão de ser igual a Deus para seguir um caminho cruciforme. Um caminho que não busca poder, mas é edificado no serviço e amor a outros. Somos chamados a caminhar e encontrar a vitória nesse mesmo caminho cruciforme.
Reflita a respeito:
- Separe alguns momentos e pergunte ao Espírito Sando se existem áreas em suas interações com outros onde você precisa crescer. Peça ao Espírito Santo que mostre oportunidades de compartilhar os frutos do Espírito.
- Pare um momento durante uma interação de discipulado ou liderança durante essa semana e pergunte ao Espírito Santo: o que você deseja fazer nesse momento? Escute com atenção e faça perguntas chave que levem o outro em direção ao que Cristo já está fazendo. Responda ativamente mostrando o amor, a paciência, a bondade e a gentileza de Deus.