Quando eu tinha cinco anos, minha irmã Danielle tinha uma amiga que morava em frente a um cercado de cavalos. Passávamos por eles todos os dias depois de levar meu pai à estação de trem para ir trabalhar. Como gosto muito de animais, um dia perguntei à amiga da Danielle qual era o nome do cavalo marrom. A Caroline respondeu “esse é o cavalo da Melany”. Mas o que eu ouvi (para o prazer da minha mãe e da minha irmã) foi “essa é a Melany tempero” [as palavras cavalo (horse) e tempero (sauce) tem pronúncias parecidas em inglês, por isso a autora se confundiu]. Literalmente, por anos eu chamava aquela égua de “Melany tempero” e toda vez que a via, apontava e mostrava para a minha mãe que, só para constar, nunca disse nada. Não estou brincando, eu tinha uns vinte anos quando finalmente percebi o erro.
Imagens (figuras de linguagem) que fazem sentido
Deus não é igual a minha mãe. Quando Deus quis comunicar Sua história, Ele tomou medidas meticulosas para torná-la compreensível na linguagem, cultura e forma de pensar do Seu povo. A história da criação em Gênesis tem elementos, linguagens e figuras que eram familiares aos israelitas por causa das histórias de criação contadas no Egito e na Mesopotâmia – nações nas quais eles viviam e que eram próximas. Quando José e sua família chegaram ao Egito, não eram uma nação com cultura, eram uma família que havia chego de Canaã para pegar comida durante um tempo de fome. Esta família viveu e cresceu em meio a cultura Egípcia no decorrer de 430 anos. A cultura nacional egípcia era a referência para os judeus. Pare e pense a respeito disso… porque a história da criação perde um pouco de significado quando você tira do contexto histórico.
As histórias de criação do Egito e da Mesopotâmia começam com um mar (que simboliza o caos). Depois disso, os deuses separam as coisas e fizeram-nas funcionar. Da mesma forma, o Genesis começa com: “A Terra era sem forma e vazia, e a escuridão estava sobre a face do abismo. E o espírito de Deus pairava sobre a face das águas” (Genesis 1:2). Deus está declarando que Ele (não algum deus estrangeiro) é quem criou e definiu um propósito para todo o cosmos – propósitos que seriam necessários para que os humanos pudessem viver e prosperar, como dias, estações, climas e comida. Os dias da criação também se referem às coisas que os Egípcios adoram (Sol, Lua, Estações, animais, etc). O Gênesis está declarando de forma definitiva que Yahweh é criador e governa suas funções.
Inauguração do Templo
A temática de sete dias era familiar aos israelitas como o período de inauguração de um templo (2 Crônicas 5) e traria essa alegoria à memória.
Um templo é um lugar onde os deuses habitam com as pessoas e é o lugar que conta a história da criação e como o mundo funciona. A inauguração era sempre um processo de 7 dias no qual várias partes do templo eram preparadas para funcionarem e a imagem do deus era trazida à vida.
Na história principal dos Egípcios, o Faraó era a encarnação do Deus Ra entre o povo, e o Faraó vivia em um “templo-palácio-jardim” que representava a criação.
Havia um grande corpo de água para representar as águas do início dos tempos (o deus Nun). Vários tipos de plantas cresciam ao redor dele e as diferentes planta representação o sol deus, o céu deus, a lua deus e o deus da fertilidade. Haviam aviários, unindo pássaros e outros animais, e todos os tipos de animais eram mantidos e cuidados lá. Nos templos do oriente próximo, a coisa mais importante é a imagem do deus: o ídolo ou eikon. É a última coisa trazida ao templo e inaugurada no que eles denominavam uma “Cerimônia de espiração”, na qual os sacerdotes promungam inspirando ou “dando vida” aos ídolos. Esses ídolos são a presença do Deus com as pessoas no templo-palácio-jardim. Essa é a cultura e a história que povo de Deus (futura nação judia) estava vivendo por quatrocentos anos.
No Gênesis, Deus constrói para Si um templo-palácio-jardim chamado Éden. Lá há água, árvores e animais, e o sol, a lua e o céu. Mas eles não eram deuses para serem adorados, na realidade foram criados pelo Yahweh como um lugar para Ele habitar conosco. Vamos ver essa mesma representação mais tarde no tabernáculo e nos templos israelitas (nos quais a palavra hebraica ‘hechal’, que na maior parte das traduções é trazida como Santo dos Santos, pode ser literalmente traduzida como ‘templo-palácio’, em cujas paredes tem gravados jardins com árvores, flores e frutos). É a figura que mostra que a criação inteira é o templo de Deus – o espaço onde ele habita com Seu povo.
Deus coloca os humanos no seu jardim como portadores da Sua imagem ou ‘eikons’ (hebreus 1: 3; II Coríntios 4: 4; Colossenses 1: 15) e inspirou Sua vida neles (gênesis 2: 7). A simbologia é de que os seres humanos serão os ídolos, não para serem adorados, mas para carregar a imagem de Deus, e manifestar Sua presença, Sua vida e o reino por toda a terra!
Precisamos reivindicar a figura de gênesis 1 e 2 – de Deus como um criador glorioso de um ‘templo cosmos’ e humanos como sua imagem. Precisamos reivindicar a representação de um Deus que deseja habitar com humanos, e onde a humanidade floresce no Seu mundo. Como naquela história de infância da “Melany Tempero”, precisamos separar um tempo para refletir na história de deus que ouvimos e que temos imaginado. Precisamos nos certificar de que ouvimos direito e reivindicamos a representação colocada na história bíblica…para sabermos como ser completamente humanos e sabermos viver.
Algumas coisas para refletir
Há algum ponto do relato de Gênesis colocado acima que você ainda não havia escutado? De que maneiras esses pontos mudam ou aumentam a sua compreensão de quem Deus é? Ou o propósito da humanidade? Ou o propósito da criação?
De que forma isso mudaria ou adicionaria coisas ao jeito como você discipula as pessoas?
Para ler mais nesse assunto, eu recomendo:
The Lost World of Genesis One: Ancient Cosmology and the Origins Debate by John H. Walton
(O mundo perdido de Gênesis um: cosmologia antiga e o debate sobre as Origens – de John H. Walton – ainda não disponível em português)